domingo, 2 de fevereiro de 2014

Lá em casa, lá na casa onde eu era criança, as compras de comida eram feitas na cooperativa do ferroviários. Havia uma caderneta já com a relação dos produtos e uma vez por mês um filho era escalado pra ditar pra minha mãe e ela ia especificando as quantidades.
A caderneta era entregue lá na cooperativa e uns dias depois vinha um carroceiro entregar a "compra". Todo mês era o mesmo ritual.
Mas uma vez por ano, meu pai avisava: a cooperativa "abriu limite". Abrir limite era o máximo. Significava que iríamos comprar tecidos.
Num dia bem cedinho, saiamos minha mãe e minha irmãs. Na cooperativa havia uma longa fila, acho que esse limite era aberto pra todos os ferroviários e esperamos na fila por umas 4 horas. Lá pelo meio dia chegava a nossa vez. Era atendido uma família por vez. O vendedor ia então abrindo as peças de tecido no balcão. Musselinas, chifom, chamelote, Piquet, voal, ana ruga, cretone para lençóis. Uma profusão de cores e texturas. Minha mãe não me deixava escolher, ela decidia o tecido e a prioridade. Filhas mais velhas eram privilegiadas. Eu, a mais nova tinha que aceitar a escolha. Mas não achava ruim, a mãe sabia o que era melhor. Já em casa, ela escolhia os modelos que estavam moda e aqueles cortes viraram lindos vestidos.
Acho que só antigamente os tecidos encolhiam. Então minha mãe lavava todos os tecidos antes de costurar. Eu não entendia porque ela fazia isso. Ela tirava do tecido o que eu mais gostava: o cheiro da goma, o cheiro do tecido novo. Eu guardava retalhos que não tinham sido lavados só pra ficar sentindo o cheiro da goma.
Hoje fui numa loja de tecidos. Uma loja grande. Uma profusão de tipos, cores e texturas. Fiquei por ali na loja passeando entre os corredores, sentindo o cheiro, a maciez dos tecidos, as cores. A vendedora solicita quis saber por 2 vezes se já tinha sido atendida. Com explicar pra ela o que eu queria?? Eu queria minha mãe ali pra comprar tecidos e fazer vestidos pra mim. Eu queria a minha infância.

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