sábado, 16 de março de 2013


Essa tal felicidade
E porque na casa o costume era dormir cedo, mal acabava o Seriado Bonanza, que o pai e os irmãos assistiam, as luzes eram apagadas, e a ordem era deitar.
Mas se deitada o sono não vinha, o jeito era cobrir a cabeça, e começar a sonhar. O que poderia ser um tormento, pra ela acabava sendo uma coisa boa. E ouvindo um latido do cachorro ao longe, um trovão e mesmo o ronco do pai, ela começava a sonhar. Não sonhava garrar o mundo, ainda não sentia a vontade de ir embora, isso só sentiria mais tarde, quando já desiludida, quisera por fim de ver aquelas paisagens. Não sonhava casar, ter filhos, não sonhava ser como a mãe, que vivia ali pra aquele homem, sem nenhum carinho. O pai só ficara carinhoso quando ficou mais velho, e ficou tão carinhoso que nem parecia o mesmo homem. Não sonhava escrever um livro, nem se importava com os elogios do professor . Não planejava trabalhar na cidade, não sonhava com um futuro. Sonhava com o presente. Sonhava acordar um dia de possibilidades. Sabe esse sentimento de querer que aquele dia pudesse ser diferente? E ela imaginava que assim é que começaria a sua felicidade. E, é claro, haverá sempre mais. Nunca lhe ocorreu que não era o começo. Já era a felicidade, bem ali.
A felicidade era a capacidade que ela tinha de sonhar.