Lá em
casa, lá na casa onde eu era criança, as compras de comida eram feitas
na cooperativa do ferroviários. Havia uma caderneta já com a relação dos
produtos e uma vez por mês um filho era escalado pra ditar pra minha
mãe e ela ia especificando as quantidades.
A caderneta era entregue
lá na cooperativa e uns dias depois vinha um carroceiro entregar a
"compra". Todo mês era o mesmo ritual.
Mas um...a
vez por ano, meu pai avisava: a cooperativa "abriu limite". Abrir
limite era o máximo. Significava que iríamos comprar tecidos.
Num
dia bem cedinho, saiamos minha mãe e minha irmãs. Na cooperativa havia
uma longa fila, acho que esse limite era aberto pra todos os
ferroviários e esperamos na fila por umas 4 horas. Lá pelo meio dia
chegava a nossa vez. Era atendido uma família por vez. O vendedor ia
então abrindo as peças de tecido no balcão. Musselinas, chifom,
chamelote, Piquet, voal, ana ruga, cretone para lençóis. Uma profusão de
cores e texturas. Minha mãe não me deixava escolher, ela decidia o
tecido e a prioridade. Filhas mais velhas eram privilegiadas. Eu, a mais
nova tinha que aceitar a escolha. Mas não achava ruim, a mãe sabia o
que era melhor. Já em casa, ela escolhia os modelos que estavam moda e
aqueles cortes viraram lindos vestidos.
Acho que só antigamente os
tecidos encolhiam. Então minha mãe lavava todos os tecidos antes de
costurar. Eu não entendia porque ela fazia isso. Ela tirava do tecido o
que eu mais gostava: o cheiro da goma, o cheiro do tecido novo. Eu
guardava retalhos que não tinham sido lavados só pra ficar sentindo o
cheiro da goma.
Hoje fui numa loja de tecidos. Uma loja grande.
Uma profusão de tipos, cores e texturas. Fiquei por ali na loja
passeando entre os corredores, sentindo o cheiro, a maciez dos tecidos,
as cores. A vendedora solicita quis saber por 2 vezes se já tinha sido
atendida. Com explicar pra ela o que eu queria?? Eu queria minha mãe ali
pra comprar tecidos e fazer vestidos pra mim. Eu queria a minha
infância.
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